sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Sonetos de Shakespeare

eu parei em frente a uma livraria, e como um cachorro que só sabe do tempo que anda com o olhar no frango que gira,
como o cachorro que sabe da gravidade pela baba que desce da boca...

fiquei horas seguidas ali babando sobre a vidraça, que não permitia que minhas mãos tocassem nos sonetos de Shakespeare

o comerciante de livros aproximou-se com um sorriso fosco.
perguntei quanto custaria para que os sonetos fossem meus?
ele então sorriu, menos fosco e mais vil. E disse-me: custa tanto!

o tanto que ele disse era pouco, nem sabia... até porque ele vendia Shakespeare, pense, junto com culinária e magia.

mas as minhas mãos queriam tocar os sonetos de Shakespeare

cavei o bolso e cédula a cédula, moeda a moeda, deu justo pra pagar e voltar pra casa e nada mais.

essa noite eu sou um homem sem garantia de que amanhã eu terei casa, porque eu não paguei o aluguel

quanto a minha alma, ela sobrevive a essa ameaça, tomada pela mais sublime graça em habitar os sonetos de Shakespeare




(trecho do texto declamado pelo personagem Naum, interpretado por Gero Camilo, no último episódio de Som & Fúria)

Nenhum comentário:

Postar um comentário