Nasci em 1981 e minha mais remota memória de um jogo de futebol é a eliminação do Brasil na Copa de 86. Não lembro do jogo em si, lembro apenas do meu tio xingando o Zico.
Dentre essas memórias mais longinquas ainda estão as defesas de pênalti
do Gaúcho pelo Palmeiras contra o Flamengo e o gol do Viola na final do
Paulista de 1988.
No estádio, o primeiro jogo que fui, junto com um colega da rua e o pai dele, foi no Morumbi, um São Paulo e Goiás pela Copa União. Nessa época empate ia pros pênaltis, se minha memória não me trai, o São Paulo levou na decisão de penalidades. Lembro de um torcedor ao nosso lado que gritava com um jogador são paulino: “Fulano, você entregou o ouro no outro jogo.” Eu fiquei algum tempo matutando, tentando entender o que era “entregar o ouro”.
Sou palmeirense por influência do meu pai, talvez seja essa a nossa única afinidade nos campos da política, futebol e religião.
Cresci colecionando figurinhas, revistas Placar, jogos de botão, recortes de jornal, mas não lembro de ter tido um ídolo de fato na primeira infância, talvez o Careca pelos gols no Napoli e na Seleção.
Na escola jogávamos futebol com potes de iogurte – os de Danup eram os mais disputados por aguentarem mais – bolas de meia, de papel com um monte de durex envolto, que quase sempre não duravam a partida inteira. Qualquer lugar virava campo de futebol: o corredor, o pátio, o portão, as ruas sem saída perto do colégio - nelas as mochilas viravam traves. Luxo e festa era quando o professor liberava o futebol na aula de Educação Física, dava água na boca quando a salinha de material esportivo era aberta e quicavam aquelas bolas branquinhas, novinhas. O lateral ainda era cobrado com a mão e só podia fazer gol dentro da área.
Morava perto de um campo de terra, tínhamos um time chamado Nova Era, o uniforme era camiseta branca com o número preto costurado nas costas. Shorts e meião não eram obrigatórios, íamos com o que dava. Chuteiras, então, era pra poucos, e a menina dos olhos eram as da marca Drible, que minha mãe sempre dizia ser muito cara pra comprar. Mas me virava bem com o kichute e o cadarço amarrado na canela.
A disputa era com os moleques das ruas e praças vizinhas, apostávamos tubaína
e biscoito sequilhos. O jogo não tinha marcação de tempo, era no
esquema vira 5 acaba 10, dependendo do tamanho do campo era vira 10
acaba 20, quanto mais demorado, melhor. Às vezes, um marmanjo, irmão de
algum baixinho folgado, se intrometia na peleja, não era raro o pau
fechar e sairmos correndo pra casa.
A bola sempre foi minha companheira, cansei de tomar bronca por quebrar as coisas dentro de casa, por jogar a bola na parede, simulando cruzamentos pra que eu cabeceasse, fingindo marcar gols em alguma baliza improvisada com cadeiras.
Não gostava quando chegava a temporada de soltar pipa, ou quando se inventava alguma outra mania com qualquer outro tipo de brincadeira. O meu negócio era jogar bola, dia e noite, dispensando qualquer outra distração.
Puxando pela memória as minhas mais remotas lembranças, é impossível dissociá-las do futebol ou de uma bola.
Lembranças que ecoam sorridentes e vivas nos meus pensamentos.
(publicado originalmente no Blog O Fino da Bola em 18 nov 2011)